Uma candidata de 40 e poucos anos, com cabelos castanhos escuros e fios grisalhos, veste um blazer cinza e está sentada em frente a um laptop sobre uma mesa de madeira escura. Ela conversa com dois profissionais — um homem e uma mulher — que tomam notas em cadernos, enquanto documentos e canetas estão dispostos sobre a mesa. O ambiente transmite seriedade e colaboração em uma reunião de alto nível para elaboração do plano de governo, destacando o papel das entrevistas com o candidato no processo.

Guia prático para transformar as entrevistas com o candidato em propostas consistentes

Foto de José Roberto Martins

José Roberto Martins

Jornalista e Especialista em Comunicação Governamental e Marketing Político | IDP Brasília

Veja como dar identidade, coerência e força política ao plano de governo.

Um plano de governo ganha vida quando vai além de dados técnicos, tabelas ou propostas genéricas. Quando une o diagnóstico ao jeito de falar, aos valores e às histórias do candidato.

É sobre isso que estamos falando nesta série de artigos sobre por que as entrevistas com o candidato são essenciais na construção do plano de governo.

Tratamos sobre as entrevistas em profundidade e sobre o famoso diamante! Ambos revelam vocabulário, prioridades e exemplos concretos ligados à vida e à trajetória do candidato e que dão ao plano de governo um jeito único de dialogar com o eleitor.

Agora, neste último artigo da série, vamos conversar sobre como aplicar isso tudo na prática, para, afinal, fortalecer o plano como peça central na construção de uma campanha vitoriosa.

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Passo 1 – Decupar o material das entrevistas com o candidato

Em primeiro lugar, é necessário trabalhar o material coletado. A entrevista em profundidade, por ter caráter confidencial, não deve ser gravada. O ideal é apenas registrá-la em anotações. No máximo, uma gravação em áudio, que deve ficar restrita a pouquíssimas pessoas da equipe. O que o candidato compartilha nela serve para orientar a estratégia da campanha, não para divulgação pública.

Já a entrevista diamante, gravada, precisa passar por decupagem. Aqui é importante reforçar: decupar não é apenas transcrever. Transcrever é converter áudio em texto. Decupar é interpretar. É ouvir de novo para entender a emoção, o ritmo, a ênfase, o jeito de falar. Às vezes, uma frase parece boa no papel, mas o tom em que foi dita transmite desânimo, dúvida ou falta de energia. Nesse caso, não serve para o plano nem para a comunicação.

Decupar é, portanto, mapear palavras e sentimentos: quando o candidato fala com brilho nos olhos e convicção, quando hesita, quando insiste em um ponto. É esse cuidado que permite selecionar trechos autênticos e transformar a matéria-prima das entrevistas com o candidato em parte do plano de governo ou em peças de campanha.

Passo 2 – Como transformar falas em subsídio para o plano

Vamos ver exemplos reais de entrevistas feitas em campanhas nas quais trabalhei. São entrevistas que decupei para preparar materiais de comunicação. No nosso caso, veremos como elas podem ser úteis para a construção do plano.

Exemplo real 1:

“Nós somos de origem bem humilde… às vezes não tínhamos o que comer à noite. Mas meu pai era correto, sincero, nunca passou por cima de ninguém. Eu herdei dele esse jeito de respeitar os outros. E sempre trabalhei de forma planejada, com responsabilidade, porque sei o valor de cada esforço.”

No plano, isso se transforma em:
“Uma gestão feita com planejamento e responsabilidade, voltada a enfrentar a desigualdade social e abrir oportunidades para as famílias que já sentiram de perto as dificuldades.”

Ou seja, a biografia vira compromisso político, em linguagem humana e calorosa.

Exemplo real 2:

“A cidade é um gigante adormecido. Nós precisamos acordá-lo e mostrar a sua força. Precisamos, em primeiro lugar, despertar o orgulho das pessoas. Deixar a nossa cidade mais bonita, mais florida, mais limpa, mais aconchegante. Quem de nós não chega em sua casa e se sente feliz ao ver o seu jardim florido, a sua casa pintada, bonita, atraente? A família recebendo de braços abertos. A nossa cidade é um pouco maior, mas é isso”.

No conjunto de propostas, essa fala pode virar:
“O plano prevê ações de urbanismo e revitalização dos espaços públicos para fortalecer o orgulho de viver aqui. Assim como cuidamos da nossa casa, vamos cuidar juntos da nossa cidade.”

Assim, emoção vira diretriz de políticas urbanas com sentido de pertencimento.

Exemplo real 3:

“As pessoas me diziam que naquela área tudo alagava. Juntei recursos até conseguir resolver. Fiz drenagem, asfalto e mostrei que promessa feita é promessa cumprida. E mais: saúde sem saneamento não existe.”

Uma fala dessas pode inspirar o plano assim:
“A gestão vai priorizar obras de drenagem e pavimentação para enfrentar os pontos de alagamento e melhorar a mobilidade urbana. Além disso, haverá investimentos na ampliação da rede de saneamento básico, com coleta e tratamento de esgoto e abastecimento de água de qualidade. Porque saúde e qualidade de vida começam pelo acesso a serviços essenciais.

Em suma, experiência vivida sustenta a prioridade de gestão com encadeamento lógico: problema, ação, resultado.

Síntese operacional: como aplicar as entrevistas no plano

O diamante e a entrevista em profundidade dão a matéria-prima. A decupagem organiza e interpreta o que foi registrado nas entrevistas. Para sistematizar, guarde este guia rápido:

  1. Garimpe falas fortes das entrevistas — experiências, valores e prioridades que expressem a identidade do candidato.
  2. Relacione falas e dados — para dar lastro técnico e orientar metas.
  3. Redija o plano com o vocabulário do candidato — pensando em clareza, usando verbos de ação e mantendo a naturalidade de quem falaria aquilo em público.

Modelo de transformação em três linhas (exemplo aplicado):

  • Fala: “Saúde sem saneamento não existe.”
  • Dado: X% das casas sem coleta; tantos pontos de alagamento recorrente.
  • Proposta: Ampliação da rede de coleta e tratamento de esgoto, cronograma por bairro, metas trimestrais e monitoramento público.

Em resumo: voz própria e confiança para vencer

O uso de entrevistas com o candidato para inspirar o plano de governo é a chave para transformar um documento comum em uma peça estratégica. A entrevista em profundidade oferece autenticidade. A entrevista diamante fornece vocabulário público e narrativa.

Quando tudo isso se encontra, o plano fica pronto para virar discurso, vídeo e post, mantendo coerência em todos os espaços da campanha. Como resultado, temos um plano vivo: verdadeiro para o candidato, convincente para o eleitor e útil para uma campanha vencedora.